Decisão do STF visa frear judicializações excessivas e garantir sustentabilidade orçamentária do Sistema Único de Saúde.
Em setembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu novos critérios para a concessão de liminares judiciais para acesso a medicamentos via Sistema Único de Saúde (SUS). A corte determinou que, para que pacientes obtenham judicialmente medicamentos não incorporados aos protocolos do SUS, eles devem cumprir uma série de exigências rigorosas. A medida visa evitar que disputas jurídicas direcionem o orçamento destinado à saúde sem a intermediação dos tribunais.
Antes da decisão, os médicos podiam comprovar a necessidade para que o paciente recebesse o medicamento. No entanto, a nova regra exige uma comprovação mais detalhada e extensa. O STF aprovou a tese que determina a apresentação de um laudo médico detalhado comprovando a imprescindibilidade do medicamento, além de exigir que o paciente demonstre a ineficácia dos tratamentos oferecidos pelo SUS, sua incapacidade financeira e a existência do registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Após setembro de 2024, o ônus probatório recai ainda mais sobre o autor da ação, que precisará provar, entre outros pontos, a negativa de fornecimento do medicamento pela via administrativa e a ausência de alternativas terapêuticas. Também será necessário apresentar evidências científicas robustas, como ensaios clínicos randomizados e revisões sistemáticas, para comprovar a eficácia e segurança do tratamento.
Impactos no setor de cannabis
A decisão do STF gerou grande impacto no setor de cannabis medicinal, especialmente em relação às ações que buscam a concessão de produtos à base da planta pelo SUS. O advogado especializado em direito à saúde, Leonardo Navarro, explica as implicações dessa decisão:
“O STF, com esse posicionamento, transformou o fornecimento de medicamento pelo Estado ‘por via judicial’ em uma excepcionalidade”, afirmou Navarro. Ele destacou que os pacientes enfrentarão desafios ainda maiores para obter medicamentos via Sistema Único de Saúde. “Com absoluta certeza, os pacientes que demandarem em face de um ente público – União, Estado ou Município – para acesso a medicamentos, enfrentarão mais dificuldades para acesso aos produtos à base de cannabis.”
Navarro também apontou que o setor de cannabis já vinha sendo impactado por uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O qual isentou operadoras de saúde de fornecerem medicamentos orais de uso domiciliar. Agora, com os novos requisitos estabelecidos pelo STF, as ações contra o SUS também se tornam mais complexas.
“Esses requisitos, fixados para demandas por medicamentos, são considerados complexos e praticamente impossíveis de cumprimento pelos pacientes. Como o paciente irá provar a ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec ou da mora na sua apreciação?”.
Além disso, o advogado ressaltou a dificuldade de comprovar a eficácia dos produtos à base de cannabis. “Outro ponto crítico será a comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco. Necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise. Sabemos que os produtos derivados de cannabis ainda carecem dessa comprovação e, com certeza, esse será um grande obstáculo a ser superado nas demandas contra o SUS. Navarro conclui que os advogados devem elaborar e instruir muito bem cada ação.
[…] Teresa Leitão ressaltou a relevância dos projetos de lei em tramitação no Congresso, como o PL 4.776/2019, que aborda o uso medicinal da planta. Ela fez um apelo para a aprovação dessas propostas, destacando que o tema, frequentemente tratado com “preconceito e desinformação”. E requer uma abordagem cautelosa e a capacitação adequada de profissionais de saúde. […]